por Claire Gillespie
Meu filho de 12 anos pega o copo rosa, enche com suco, e toma um gole. “Não é”, ele diz. “Rosa é para meninos também”.
Foi um momento fugaz durante uma refeição familiar tipicamente frenética. Mas isso me fez parar e sorrir. Contra todas as probabilidades – ou seja, apesar do sexismo enraizado na sociedade – meus esforços para criar um filho feminista parecem estar valendo a pena.
Muito do feminismo foca em ampliar opções para nossas filhas, e é óbvio que isto é imperativo – Eu estou criando jovens mulheres feministas também. Mas nós precisamos ampliar as opções para nossos filhos ao mesmo tempo. “É importante criar meninos para serem feministas não apenas para que eles possam ser fortes aliados de pessoas desfavorecidas, como mulheres e outras minorias sociais, mas também porque é mais saudável para os próprios meninos”, diz Taryn A. Myers, Ph.D. e professora associada de psicologia da Virginia Wesleyan University. “Isso faz com que eles saibam que é okay experienciar e mostrar emoções, o que é muito mais saudável em termos psicológicos do que nosso pensamento corrente, baseado em ‘seja homem’ e ‘homem de verdade não chora’”.
É também parte de um esforço mais amplo para melhorar a sociedade para todos. “Se nós queremos fazer a diferença nas taxas de assédio sexual, violência doméstica etc., nós precisamos ensinar os meninos a não terem essas práticas – em vez de ensinar as garotas a como protegerem a si mesmas”, diz Myers.
Pode ser difícil romper com tais padrões na medida em que eles tendem a ser passados de geração para geração. Mas enquanto eu não afirmaria que criar meu filho (e filhas) como feminista é fácil, definitivamente também não diria que é uma ciência tão complexa. Pequenas coisas podem contribuir muito lá na frente se você as colocar em prática desde o início. Por exemplo, todas as crianças tinham (e têm; minha filha mais nova tem 14 meses) uma grande variedade de brinquedos à sua disposição – não apenas bonecas e uma cozinha para minha garota e caminhões e uma caixa de ferramentas de madeira para meu filho (bocejo). Não sigo regras ultrapassadas de cores e tento sempre que posso servir de exemplo para meus filhos.
Servir de exemplo, em termos de papéis sociais, é uma grande parte do ensinar às crianças sobre igualdade de gênero, afirma Talya Miron-Shatz, Ph.D., CEO da Buddy & Soul e pesquisadora visitante da Cambridge University. “Começa com tanto a mãe quanto o pai dirigindo o carro e pagando em um restaurante”, diz ela. “Continua com a mãe tendo um papel e uma posição no mundo e aos seus próprios olhos. Além disso, trata-se de tratar nossos filhos como pessoas, não como uma ‘garota que deve ajudar a mãe a arrumar a mesa’ e um ‘menino que deve sair e jogar bola.'”
De fato, é importante garantir que as crianças tenham uma mãe ou uma figura feminina poderosa em suas vidas, diz Miron-Shatner. “Se são sempre as mães que acompanham as viagens escolares porque os pais estão trabalhando, ganhando dinheiro e sendo pessoas importantes no mundo, é difícil para uma criança internalizar que mulheres e homens são – ou deveriam ser – iguais”.
Essa é a definição de feminismo em sua radicalidade, explica Miron-Shatz. Não se trata de queimar sutiãs ou odiar homens. É simplesmente ver os papéis de gênero como iguais. “Nesse sentido, ‘radical’ significa ‘vindo da raiz'”, diz Miron-Shatz. “Quando você cria seu filho para ser feminista, você o ensina a ser uma pessoa melhor e mais igualitária”.
Conversas diretas sobre todos os aspectos da igualdade de gênero também são vitais. Myers nos aconselha a falar sobre consentimento cedo, mas também a praticar o que você prega. Por exemplo, não faça seu garoto abraçar alguém que ele não quer abraçar e ajude-o a se sentir à vontade perguntando antes se pode abraçar ou beijar alguém.
Alguns dos maiores obstáculos para os pais que tentam mudar a narrativa sobre gênero são aqueles colocados em nossos caminhos por outros, seja por outros pais que descrevem minha filha como “um menininho” porque prefere escalar árvores do que pintar as unhas, seja por narrativas, na TV e em filmes, que retratam personagens masculinos que nunca choram.
Emily Kane, professora de sociologia na Bates College e autora de The Gender Trap: Parents and the Pitfalls of Raising Boys and Girls, afirma que sua pesquisa mostra claramente que os pais se preocupam muito com a maneira como o mundo julgará seus filhos se eles não se adequarem às normas de gênero. “Quando os pais reforçam as expectativas de gênero, muitas vezes temem que seus filhos (especialmente os meninos) sejam provocados, ostracizados ou excluídos se não se alinharem a essas expectativas”, ela explica. “Todos nós podemos ajudar, evitando julgamentos e essas pequenas suposições diárias sobre o que uma criança deve gostar ou ser habilidosa em fazer com base em seu gênero”.
Surpreende-me que mesmo em 2020, quando o #MeToo ainda está fresco em nossas mentes e questões como a disparidade salarial de gênero, a identidade de gênero e o direito ao aborto estão demandando cobertura midiática e no centro das conversas e debates nas mídias sociais, os pais ainda não pensam que a igualdade de gênero deva estar em seu radar. Em vez disso, muitos se amparam na ideia de “meninos serão meninos” e “meninas serão meninas”, assumindo que os padrões de gênero na infância estão enraizados na natureza.
Infelizmente, não há muito que você possa fazer a respeito dos outros pais. “Eles podem certamente rejeitar o que você está fazendo, e você pode ter que explicar ao seu filho que nem todo mundo acredita que todas as pessoas são iguais, mas que, em sua casa, você acredita”, diz Myers. Da mesma forma, você não pode controlar as mensagens da mídia, mas Myers sugere transformar momentos perturbadores da TV e do cinema em oportunidades para conversar com nossos filhos sobre maneiras apropriadas de lidar com conflitos na vida real.
Agora que meu filho é quase um adolescente, tenho que acreditar que o trabalho que desenvolvi até esse momento servirá bem a ele nos próximos anos, quando ele se tornar cada vez mais independente e começar a descobrir o que ele representa.
“A educação é como uma bússola que você constrói para seu filho”, diz Miron-Shatz. “Eles saberão diferenciar o certo do errado e terão maior probabilidade de agir da maneira certa, na adolescência ou depois. Nem sempre podemos estar perto de nossos filhos quando surge um desafio, mas é nosso dever criar essa bússola interna para eles”.
Tradução livre do artigo publicado pela revista The Week. Texto original disponível em: https://theweek.com/articles/895197/how-raise-feminist-boys